Lectio Divina – Sexta-feira da 25ª Semana do Tempo Comum

Olá, meus irmãos e minhas irmãs,

Continuemos a adentrar no Evangelho de São Lucas, como nos propõe a sagrada Liturgia, hoje, no capítulo 9, vers. 18 a 22:

Aconteceu que,
18Jesus estava rezando num lugar retirado,
e os discípulos estavam com ele.
Então Jesus perguntou-lhes:
‘Quem diz o povo que eu sou?’
19Eles responderam: ‘Uns dizem que és João Batista;
outros, que és Elias; mas outros acham
que és algum dos antigos profetas que ressuscitou.’
20Mas Jesus perguntou: ‘E vós, quem dizeis que eu sou?’
Pedro respondeu: ‘O Cristo de Deus.’
21Mas Jesus proibiu-lhes severamente
que contassem isso a alguém.
22E acrescentou: ‘O Filho do Homem deve sofrer muito,
ser rejeitado pelos anciãos,
pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei,
deve ser morto e ressuscitar no terceiro dia.’

No evangelho de hoje encontramos Jesus rezando com seus discípulos num lugar retirado. Por um instante imaginemos quanta graça deste momento. Estar em um retiro de oração com o próprio Senhor. Mais uma vez, vemos a Igreja em sua plenitude reunida. Desta vez não na atividade missionária, mas no deserto da oração. Mais uma vez, vemos Cristo cabeça, unido ao seu corpo. Desta vez em oração ao Pai. Ele, o sumo sacerdote, que intercede em favor de todos, dirige ao Pai louvores, preces e súplicas. Ali está a Igreja a aprender com seu Mestre o cântico de louvor, desde sempre cantado nas moradas celestes e que o Senhor, naqueles dias, introduzia neste exílio (Cf. Laudis Canticum, 1). A partir daí jamais cessaria esse cântico. Desde então a Igreja, cabeça e corpo, jamais deixaria de estar reunida em oração em favor de todos.

Notamos, mais uma vez, o contraste do conhecimento do povo com o conhecimento dos discípulos. Jesus se interessa em saber até onde os discípulos aprenderam sobre sua pessoa. Ele mesmo estimula o contraste. A multidão não conhece o Mestre intimamente. Apenas usufrui de seus dons. Mas quanto a sua pessoa, pensa ser João Batista, Elias, algum dos antigos profetas… O discípulo de seu lado sabe quem é o Mestre. A ovelha reconhece seu pastor. Reza com ele, aprende com ele, vai para a missão com ele, é revestido da autoridade dele. Sabe que Jesus é o Cristo de Deus. Ou seja, o Messias, o Ungido. Aquele que devia salvar Israel. O discípulo já sabe porque o Reino já lhe foi antecipado, mas embora dele tenha sido feito arauto, porta-estandarte, proclamador oficial, não deve contar nada a ninguém sobre a pessoa de Jesus, pois ainda não é chegado o momento de todos saberem. Imaginemos a ansiedade do discípulo, ávido para espalhar ao mundo a graça de tão profundo conhecimento.

Mas algo de difícil entendimento seria dito por Jesus naquele dia. Para os discípulos, um anticlímax: ‘O Filho do Homem deve sofrer muito,
deve ser rejeitado pelas autoridades de Israel e ser morto, mas ressuscitar no terceiro dia.’ O que o Messias, o Cristo de Deus estaria querendo dizer? Devem ter perguntado. Isso não fazia o menor sentido.

Mas, esqueçamos por enquanto o anticlímax e voltemos ao clímax.

Jesus é o Cristo de Deus!

Desejamos de coração estar com ele? Quanto do nosso tempo reservamos para estar a sós com o Senhor? Como discípulos, temos nos sentado aos pés do Senhor para aprender com ele? Sabemos quem ele é, do que é capaz, o que veio nos oferecer? Estamos unidos a ele em seu cântico de louvor perene que, como sumo-sacerdote eleva incessantemente ao Pai? Pelo batismo, tornamo-nos também ungidos, como Cristo. Em que medida vivemos esta unção celeste que nos foi concedida?

És o Cristo de Deus. Eis a verdade anunciada pelo apóstolo, vinda da profundidade da sua relação com o Mestre, pois conhecia-o pessoalmente.

Se não podemos conhecer o senhor fisicamente, como o apóstolo, foi nos dado conhecê-lo pela oração. É esse o terceiro degrau da Lectio Divina. Somente pela oração chegaremos ao conhecimento pleno do Senhor. Assim nos ensina Guigo, o cartuxo:

Vendo, pois, a alma que não pode por si mesma atingir a desejada doçura de conhecimento e da experiência, e que quanto mais se aproxima do fundo do coração (Sl 64,7), tanto mais distante é Deus (cf. Sl 64,8), ela se humilha e se refugia na oração. E diz: Senhor, que não és contemplado senão pelos corações puros, eu procuro, pela leitura e pela meditação, qual é, e como pode ser adquirida a verdadeira doçura do coração, a fim de por ela conhecer-te, ao menos um pouco.

Eu buscava, Senhor, a tua face, a tua face Senhor, eu buscava (cf. Sl 27,8); meditei muito tempo em meu coração, e na minha meditação cresceu um fogo (cf. Sl 39,4) e o desejo de te conhecer ainda mais.

Quando me repartes o pão da Sagrada Escritura, na fração do pão te tornas conhecido por mim (cf. Lc 24,35). E quanto mais te conheço, tanto mais desejo conhecer-te, não já na casca da leitura, mas no sabor da experiência.

Isto não peço, Senhor, por meus méritos, mas pela tua misericórdia.

Confesso-me indigna pecadora, mas até os cãezinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos (Mt 15,27).

Dá-me, pois, Senhor, o penhor da herança futura, uma gota ao menos da chuva celeste, para arrefecer a minha sede, pois ardo de amor (cf. Ct 2,5). (Scala Claustralium, VI)


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